Uma reportagem notável.
>> terça-feira, novembro 13, 2007
"Em Junho de 2007 Fernando Guerra foi comissionado pelo Arquitecto Alexandros Tombazis para realizar uma reportagem fotográfica e um pequeno documentário sobre a nova Igreja da Santíssima Trindade em Fátima.
Um dos primeiros trabalhos realizados foi seguir a produção das diversas obras de arte. Neste slideshow mostramos uma delas: o processo de fundição dos baixos relevos em bronze para as portas da nova Igreja. O projecto é da autoria do artista Português Pedro Calapez. A fundição é a do senhor Cosme. O sítio, uma pequena aldeia perto do Porto."
É com este texto que se enquadra, no site do fotógrafo Fernando Guerra, uma das mais notáveis reportagens fotográficas que vi feitas em Portugal.
Entramos numa fundição "artesanal", que tem desde logo um ambiente invulgar. A luz é a das pinturas de Vermeer, o calor do lugar sente-se nos torsos nus dos artesãos. Começam a "ouvir-se" correntes. Não é difícil, apesar da bem seleccionada banda sonora, imaginar o ruído que por lá devia andar. O fotógrafo é uma presença transparente que nenhum olhar trai.
Surge então uma peça doirada envolta numa nuvem que a torna etérea, mágica. É coberta com um material que parece terra (será?) e inicia-se um processo alquímico em que vários homens parecem pisar aquela terra com uns paus, minuciosamente, como se pisassem uvas num lagar. Cantariam?
No andamento seguinte, a banda sonora entusiasma-se e entra o fogo. Não sem que antes passe um pequeno cão inverosímil, que acrescenta (passe o paradoxo) humanismo à cena.
A luz que anteriormente provinha do exterior, coada, nasce agora no metal incandescente, iluminando os rostos sofridos de quem o maneja.
Ainda haverá espaço para a aparição de uma garrafa de água saciando uma garganta seca e provavelmente escaldada de ar.
A personagem seguinte é absolutamente impressionante. Parece ter fugido das Tentações de Santo Antão de Hieronymus Bosch e embrulha-se como um homem sem rosto, protegendo-se do excesso de calor. Pergunto-me como terá suportado isto o próprio fotógrafo em quem ninguém parece reparar.
Toda a gente enverga agora grossas vestes. Os rostos cobertos, os olhos protegidos. Escorre o metal, como lava ardente, de dentro do cadinho, enchendo os moldes.
O cadinho escorre, arrefece e perde luz. Ainda aquece uma marmita que não parece ser deste filme. As roupas voltam a sair e vêm de novo os cães. Começamos a sair do inferno e continuamos vivos.
Vemos finalmente o resultado de todo este esforço. Peças notáveis de Pedro Calapez. Mistura-se a pele do bronze com a pele da mão que o toca. Sentimos nós também a textura da peça e a dureza da pele curtida pelo trabalho.
Cai o pano.
Vale a pena reservar uns minutos para ver este trabalho com atenção. Eu fiquei esmagado.
ZM
1 comments:
impressionante e muito bonita a reportagem fotográfica de Fernado Guerra e também as tuas palavras a descreve-la, parabéns!
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