Impressões de Angra

>> sábado, janeiro 09, 2010

Primeiras impressões da Terceira

Ao fim de quase duas semanas a morar em Angra do Heroísmo, aqui ficam breves notas sobre esta ilha.
Para lhe dar totalmente a volta, junto ao mar, apenas é necessário percorrer cerca de 82 km. A paisagem é sobretudo verde, quadriculada pelos muros de pedra vulcânica que cercam conjuntos de vacas preguiçosamente espojadas na erva.
Apesar de pequena, a Terceira tem uma variedade de ambientes surpreendente, tanto do ponto de vista da paisagem natural como do ponto de vista humano, arquitectónico, social, etc. Numa ilha tão pequena, há locais no interior com mais de 1000m de altitude. É impressionante.
A Terceira parece estar relativamente polarizada entre a capital – Angra do Heroísmo – e a Praia da Vitória, perto do aeroporto (e base aérea militar) das Lages, cidades unidas pela única via rápida da ilha, que tem o nome de Via Vitorino Nemésio. Talvez por isso, nota-se um grande investimento em actividades culturais, desportivas e recreativas.
São conhecidas as “touradas”, que aqui são no meio da rua, à corda, e com o pessoal todo aos pinotes nos cornos do bicho, mas nesta altura do ano (felizmente) ainda não tivemos oportunidade de ser confrontados com esta realidade. Posso dizer que no chão do passeio à nossa porta há uns encaixes para uma barreira (tipo borladero) que deverá ser utilizada durante o período de “touradas” da nossa freguesia (lá para Junho). Parece que durante algumas horas não poderemos sair de casa sem a jaqueta e a capa.
Coisas que não há por aqui:
Pressa
Stress
Filas de trânsito
Restaurantes a preços acessíveis
Centros comerciais
Leroy Merlin, Zara, Decathlon, Ikea, Toys’R’Us, Continente, etc, etc, etc
Auto-estradas, portagens, Via Verde
Fruta de jeito nos supermercados
Um dia inteiro sem chuva

O comércio por aqui é quase exclusivamente comércio tradicional. Quando digo tradicional, podia dizer antiquado. A sensação que tenho a tentar comprar alguma coisa aqui em Angra é a de que aterrei na Amadora (onde nasci) há mais de 30 anos. Sempre que procuro alguma coisa, a resposta é sempre do tipo: tem que ir à livraria do Adriano ou às ferragens Tomás de Borba ou à loja do senhor Matos em Cinco Ribeiras. De resto, por vezes é desesperante. Tentei comprar um pedaço de fio eléctrico branco de 2 condutores multifilares para fazer uma trafulhice lá em casa, levando o fio de terra de uma caixa eléctrica para outra. Corri a cidade inteira e não consegui encontrar o dito fio. Tive que inventar um remendo com dois pedaços de fio que tinha levado de Sintra para resolver o problema. Tentei comprar umas poleias rústicas com um determinado tamanho e acabaram por me dizer: “Não vai encontrar isso aqui na terra” e eu (ingenuamente) perguntei: “então em que terra encontro?”. O homem, rindo, disse: “isso só no continente”. É um exercício divertido, ter que viver com o que há, mas lá nos vamos habituando.
Tentei desbloquear um telefone Vodafone para poder usar o meu número, migrado para a TMN, mas para isso teria que comprar um cartão Vodafone para carregar o respectivo custo. Ora, a loja Vodafone de Angra (sim, A loja – só há uma) não tinha cartões disponíveis, só daqui a 3 ou 4 dias. Será do mau tempo no mar?

Entretanto, tivemos também oportunidade de frequentar uma escola “normal” na Terceira profunda. Foi aquela para onde nos mandaram por não haver vaga na que pretendíamos. Se as instalações pareciam excelentes, o recheio fez-nos fugir para um colégio ao final de 3 dias de “aulas”. Um horror. A sopa do almoço chega de outra escola numa geladeira Camping Gás, daquelas da Costa da Caparica. Não, não é numa panela dentro da geladeira, é mesmo a sopa directamente dentro da geladeira. Depois é servida para os pratos utilizando um jarro de plástico que já deve ter sido branco. Um nojo.
No colégio as coisas são francamente melhores, mas sai-nos do bolso.
Dois dias de aulas depois, já temos um convite para um aniversário de uma colega da Madalena. Dir-se-ia que a diversidade geográfica se estende à cultural e educativa.
Começo francamente a gostar muito desta terra.
Uma nota final: O Expresso chega cá, embora apenas ao final da tarde de Sábado. Já me sinto mais em casa.
Hoje não temos fotos.
Na segunda-feira já teremos internet em casa.
Beijinhos e abraços.
ZM

10 comments:

Rui Silva 1/10/2010 9:12 da manhã  

Magnífico retrato. Venham os bonecos, para ilustrar.

Força
RVS

Zepa,  1/10/2010 10:07 da manhã  

Curioso... não pensei que as coisas fossem tão antiquadas aí...
Mas a distância por mar deve realmente ter influência. Falta de pensar no assunto...

Já agora... para ligares um fio de terra a outro, não devias ter usado um cabo monofilar? :-)

Abraço

Nana 1/10/2010 11:22 da manhã  

Pois isso é que é a diferença ! Do continente para a ilha ! Ter ou não ter Leroy Merlin, that's the question !
Mas quando tiveres internet, encomendas pela net !
Talvez na Base encontres coisas mais "civilizadas" ...
Estou mesmo a imaginar as lojas de ferragens e a frutaria, a leitaria ... Hihi !
Beijocas fôfas !

pedro macieira 1/10/2010 2:00 da tarde  
Este comentário foi removido pelo autor.
pedro macieira 1/10/2010 2:04 da tarde  

Pois, o Mucifal, ou Nafarros tem uma ambiente muito calmo sem stress...mas está a 40Kms de Lisboa.
Por aí o mar e a distância criará sempre algumas dificuldades nalgumas aquisições que por aqui são relativamente fáceis.

As "touradas" por aí são uma completa loucura, anualmente há marradas para todos...e é uma grande festa! (o que permite fotos únicas).

Em S. MIguel quando lá estive chamavam às passadeiras de peões "passiadeiras"...um conceito ilhéu que faz toda a diferença.

Um abraço e boa estadia

Daniel,  1/10/2010 5:42 da tarde  

Eu sei tão bem o que isso é... Os Açores primeiro estranham-se e depoiscentranham-se. E de que maneira.

EUNICE ARTUR 1/10/2010 9:03 da tarde  

Uma viagem no tempo, num espaço onde tudo nos é dado de outra forma que não a que estamos habituados, é complicado a adaptação às diferenças mas na minha opinião gosto disso.
Tenho uma amiga na escola que é vossa vizinha, já me convidou a visitar a ilha, talvez este verão :)

luis 1/13/2010 3:13 da tarde  

Isto é que é uma visão terceiro-mundista sobre a ilha Terceira. Então porque será que o concelho de Angra do Heroísmo foi eleito o mais feliz?
Para comprar o dito fio não é necessário correr a cidade toda e não o encontrar. Há vários estabelecimentos que o têm à venda, incluindo o Hiper mercado Modelo.
Para quê auto-estradas numa ilha que tem de perímetro 82 Km e de área 400 Km2?
Quanto à fruta, digo-lhe que todos os anos me desloco ao continente voluntariamente e não vejo a que por lá anda à venda seja superior.
A comida que é servida na escola é confeccionada por uma empresa continental, portanto o nojo foi importado.
Esqueceu-se de dizer que aqui pode comer boa carne e bom peixe a preços muito acessíveis, mas tem de os confeccionar em casa, já que nos restaurantes custam os olhos da cara...
Quanto às touradas terá que esperar pelo 1º de Maio, data em que se iniciam, mas também lhe digo que ser toureiro numa tourada à corda não é para todos, eu que o diga... a minha carta de toureiro tirada na última época ainda me leva hoje ao ginásio a fazer fisioterapia numa mão.

Zé Maria 1/13/2010 3:31 da tarde  

Luis,
Não sei quem é nem como encontrou este blog, mas reparo que a minha descrição o incomodou. Não desista de me ler, porque verá que, no futuro, terei muito mais de bom a dizer do que de mau.
Os portugueses em geral, e os açorianos parecem não ser excepção, detestam que se diga mal da sua terra, mesmo quando no intimo reconhecem que há coisas a criticar. É uma característica nossa e temos que saber viver com ela. Eu sabia que se fosse lido por açorianos, corria o risco de ser mal interpretado. Não leve a coisa tão a peito.
Nós viemos para cá porque quisemos. Se isto fosse pior do que onde estávamos antes, teríamos lá ficado, mas é verdade que temos tido alguns choques com que não contávamos. Já me disseram que o Modelo tem o tal fio que eu procurei na cidade, mas de facto procurei-o e não consegui encontrá-lo. Também já descobrimos boa fruta, mas no mercado e não no Modelo. Enfim, ainda estamos a sintonizar-nos com o comércio. Era só isso que pretendia dizer.
O facto de não haver auto-estradas nem portagens pretendia ser elogioso. Detesto ambas.
Quanto à carne e ao peixe, é verdade que são excelentes. Não era esta a ocasião para o referir.

Hoje mesmo tivemos o pior choque de todos: o hospital. Mas isso fica para outros episódios do nosso relato.
Terei muitas ocasiões para descrever as delícias desta terra da qual estou a gostar mais a cada dia que passa (sobretudo com o Sol que temos hoje).
Um abraço.
ZM

Unknown 1/29/2010 12:21 da tarde  

Bom dia

Passei 3 Verões na Terceira entre 1976 e 1979, entre os 12 e os 14 anos, e ganhei um ódio visceral a essa ilha. Com o passar dos anos o ódio foi passando mas ao ler este post voltou à minha memória a sensação de claustrofobia!
Claro que na época era pior: Fechada na base, ía à Praia da Vitória na "Urbana" e ao chegar lá estava a chover, só tinhamos carro para sair da base duas ou três vezes durante as fárias, li todos os livros que havia na biblioteca da Glubenkian da Praia e no terceiro ano já não havia nada para requisitar...
Hoje tenho amigos que vivem na Praia e têm casa em S. Jorge e já fui várias vezes desafiada para ir aí mas o receio da claustrofobia é sempre maior!
Acho que é um local lindíssimo, com tudo para me agradar porque em geral as mundanidades não me fazem falta nenhuma, mas...
Luísa

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