A electricidade mais cara do mundo

>> terça-feira, março 13, 2012

A propósito de um post do meu amigo Miguel, que depois de trocarmos umas impressões sobre o assunto decidiu retirá-lo para investigar mais a fundo a questão, no qual era divulgado este filme:



...não posso deixar de expor alguns comentários de clarificação:
Para começar, aqui está o gráfico dos preços da electricidade nos 27 países da UE, hoje

Os preços são tirados daqui, e neste gráfico que tem os preços para o consumidor doméstico com consumos mais baixos, Portugal aparece com 10 países à sua frente (com electricidade mais cara). Agora vejamos esta tabela para a primeira metade do ano 2011 (altura em que o IVA ainda não era de 23%):
(Source)
Aqui, os países não aparecem ordenados, mas verificamos que Portugal, até esta altura não tinha um preço final elevado relativamente ao resto dos países, notando-se contudo que o peso das taxas além do IVA é dos mais elevados, dando alguma razão a quem diz que há um peso excessivo de custos extra no preço final da nossa electricidade.

Agora reparem no que acontece com o preço da gasolina sem chumbo e do gasóleo à data de hoje, retirados do mesmo local:
No caso da gasolina, Portugal tem 6 países à sua frente, no caso do gasóleo tem 9.
O que isto significa é que a situação do preço dos combustíveis é mais grave do que a do preço da electricidade, mas ninguém parece importar-se com isso.
Actualmente está na moda dizer mal das eólicas e das barragens, como se fossem elas o que mais nos custa nas contas de cada mês. Se compararmos o que gastamos em combustíveis e em comunicações, incluindo o MEO, a Internet e os telemóveis, veremos que a conta da electricidade é uma ninharia.

Do mesmo site retirei o custo da Feed-In Tarif para eólicas on-shore, ou seja o preço a que é paga a electricidade eólica em terra ao produtor. Nos países que tinham n/a, apaguei o valor para poder fazer o gráfico. Dentro dos que têm valor atribuído, Portugal aparece a meio da tabela, com um valor que é menos de um terço daquele apontado para a Itália e o Reino Unido.

O que isto mostra é que o discurso de Mira Amaral, Patrick Monteiro de Barros e companhia vai minando a lógica da política de energia que se iniciou no governo de António Guterres (e não nos de Sócrates, como estão sempre a querer vender-nos), onde se pretendia promover a geração renovável de electricidade, reduzindo tanto quanto possível a nossa dependência do exterior.
Eu acredito que haja margem para negociar alguns contratos excessivamente benéficos a alguns produtores, particularmente no que diz respeito às co-gerações a combustíveis fósseis, que hoje já nem utilizam a componente térmica do processo e continuam a ser subsidiadas, mas daí a vir dizer que as eólicas e as barragens são a hidra do orçamento, vai uma grande distância. Até admito que a barragem do Tua, em particular, devesse ser discutida (se ainda formos a tempo), mas para isso não é necessário montar uma data de inverdades, como a de dizer que o benefício liquido da produção das barragens é nulo. Pois se elas permitem armazenar o que foi produzido por eólicas quando essa electricidade não podia ser consumida, têm certamente um papel importante no sistema electro-produtor.

Eu tenho tarifa tri-horária e desligo a totalidade dos aparelhos de audiovisual (sobretudo a box do MEO, que é um sorvedouro de electricidade) durante grande parte do dia. Com a primeira medida poupo entre 4 e 5 euros na factura mensal e com a segunda poupo mais uns 3 a 4 euros por mês. Quantos consumidores se dão a este trabalho? Poucos. Porquê? Justamente porque a electricidade é barata. Dizer o contrário é atirarem-nos areia para os olhos.

O que sinceramente me assusta é que, por um lado, não vejo as pessoas convictamente interessadas em reduzir os seus consumos de electricidade, por outro, só conheço duas formas de se ter electricidade barata nos dias de hoje: carvão e nuclear. Será que os ecologistas que tanto se manifestam contra as barragens estão prontos para travar um eventual projecto de produção de electricidade a partir de energia nuclear? Será que queremos voltar ao carvão, com todas as consequências que isso acarreta para o aquecimento global e para as chuvas ácidas?

Alguns dos que erguem a bandeira dos sobre custos das renováveis, o que têm na agenda é a produção nuclear. É gato escondido com o rabo de fora. Por isso é que tenho tanto medo que as pessoas se deixem enganar por este discurso.


8 comments:

Anónimo,  3/13/2012 4:33 da tarde  

Realmente optei por retirar o post após conversa com o Zé Maria. Ele mostrou-me o outro lado do problema (os outros lados, em boa verdade). É uma área em que o Zé se sente à vontade para esclarecer um leigo como eu.
Eu não podia, em consciência, manter o post publicado, continuando a defender um ponto de vista quando na realidade fiquei com muitas dúvidas após o Zé explicar-me o que acabou por publicar neste post.
Como noutras áreas que envolvem grandes investimentos, também na energia os interesses tendem a confundir a opinião pública. Quem, como eu, é leigo nesta matéria tende a ficar chocado com meias verdades.
Obrigado pelos esclarecimentos, Zé.
Abraço

Rui Silva 3/13/2012 4:37 da tarde  

Zé, creio que aqueles que mais convictamente se encontram contra este plano nacional de barragens, que é uma vergonha, que é inútil, e que enche o bolso à EDP e à Hiberdrola, são os mesmo que há muitos anos atrás desenvolveram uma campanha fortíssima e que envolveu as populações locais, contra as armas e a energia nuclear.

Quanto ao preço da energia desculpa mas não é barata. Comparar o preço com aquele praticado em países com PIB e rendimentos per capita muito superiores ao nosso é que me parece não contribuir nada para a resolução deste problema.

Concordo contigo no que se refere à questão da necessidade de racionar o consumo. Também me esforço por gastar o menos possível, por mim e pelo impacto que os consumos excessivos tem no ambiente.

Mas repara que o cenário da generalidade das famílias não é hoje assim tão diferente. Ainda há uma semana especialistas em questões de saúde pública relacionavam o pico de mortalidade anormal com constrangimentos ligados ao aquecimento das casas de idosos, por razões do aumento do custo da energia...

Abraço!

Rui Silva 3/13/2012 4:45 da tarde  

Correcção: Hiberdrola = Iberdrola.

Zé Maria 3/13/2012 4:52 da tarde  

Portugal é hoje o 6 país mais dependente do exterior em termos de energia, dentro dos 27. Importamos 83.1% da energia que utilizamos. A média europeia é 53.8%
A mim, isto diz que a aposta nas energias renováveis é necessária e a única alternativa a isso é a energia nuclear. Não tem volta a dar. Ou tens sol na eira ou chuva no nabal, não podes ter as duas coisas.
Esse é que é o nosso drama. Se nos mantivermos 83.1% dependentes de importação de energia (sob a forma de combustíveis fosseis), o preço da electricidade vai disparar quer queiramos quer não.
Eu acredito nesta aposta, mesmo que haja correcções de rumo a efectuar.
Gostava muito que me explicassem qual é a outra alternativa. Ainda ninguém me apresentou uma única que seja, além da pandilha do Mira Amaral. Assim como assim, prefiro encher os bolsos à Iberdrola e à EDP.

Rui Silva 3/13/2012 10:09 da tarde  

Amigo Zé, nem massa nos bolsos da EDP, nem centrais nucleares do Mira Amaral. Renováveis sim, PN de Barragens inútil, caríssimo e destruidor de rios e paisagens não.

Acredito que a coisa se terá de fazer por duas formas:

1. Redução do consumo (e aqui desculpa, amas não é a box da MEO que faz a diferença, embora seja importante que todos façamos a racionalização da energia que consumimos em casa) público, empresarial e industrial;
2. Potenciação daquilo a que se chama "disponibilidades energéticas endógenas", não destrutivas. As marés, o sol, o vento. Barragens é coisa que me desagrada profundamente. Destroem ecossistemas completos, isolam populações, alteram irreversivelmente paisagens, interferem muitíssimo com os modelos de desenvolvimento regional e nem sequer asseguram emprego que se veja.

Abraço, RV.

Zé Maria 3/13/2012 10:25 da tarde  

Resposta seguiu por e-mail. Este não é o espaço para esta discussão.
Abraço.

João Miranda Santos 3/14/2012 1:30 da tarde  

Tem bastante razão na análise que faz.
Eu acrescentaria o seguinte:
As centrais a carvão também foram fruto de uma política energética e por isso subsidiadas aquando da sua construção. Por isso é injusto querer que as energias renováveis agora entrem no mercado a competir em iguais circunstâncias com outras formas de produção, que já têm o custo capital pago, sem receberem também algum apoio.

DOMMI 3/16/2012 7:27 da tarde  
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