Levantado do Chão

>> sexta-feira, junho 18, 2010

Morreu hoje, há pouco, o escritor de quem li mais livros em toda a minha vida. Este dia havia de chegar. Chegou hoje. Morreu José Saramago.
Tal como o Rui Vasco, já percebi que muita gente parece alegrar-se com a partida deste grande escritor português. Somo à tristeza da perda a tristeza de cada vez me identificar menos com tanta estupidez à solta.
Conheci o autor pelo Memorial do Convento, algures no início da década de 80. Adorei o livro e é daqueles que tenciono voltar a ler. Tive uma gata chamada Blimunda, que teve um triste fim, e tenho ainda um Baltazar, já velhote. O outro chama-se Zorbas (Sepúlveda e o seu gato que ensinava gaivotas a voar).
Depois, lembro-me de ler tudo o que apanhei pelo caminho, nomeadamente:

  • Levantado do Chão, que adorei e que seguramente contribuiu para me empurrar para a esquerda, politicamente
  • O Ano Da Morte De Ricardo Reis
  • Jangada de Pedra
  • Todos os Nomes
  • O Evangelho Segundo Jesus Cristo
  • Ensaio Sobre a Cegueira
  • A Viagem do Elefante
  • Caim
Faltam-me ainda alguns, que espero ler entretanto. Houve um único que tentei ler e não me agarrou: História do Cerco de Lisboa.
Também é verdade que me surpreendia a arrogância do discurso e a falta de flexibilidade do pensamento no autor daqueles livros, mas isso interessa-me pouco. Interessam-me os livros e com ele morto não haverá mais. Disso tenho pena.

Encontro em dois autores actuais e bem vivos, contágio do estilo Saramago, já falei de ambos neste espaço: José Luís Peixoto e Valter Hugo Mãe.
Morreu o autor, vivam os livros.

7 comments:

Rui Silva 6/18/2010 2:54 da tarde  

Como tenho um "Levantado do Chão" em duplicado pensei, pouco depois de saber da morte de Saramago, que te ia enviar o livro, por correio. Já percebi que não vale a pena...

Em todo o caso terei todo o gosto em dar o livro em questão a quem entender que o mesmo lhe faz falta. Basta mandar-me a morada para:

ruivascosilva@gmail.com

Será a minha maneira de prestar homenagem a Saramago.

tiago borges 6/18/2010 9:58 da tarde  

Subscrevo inteiramente a sua frase: "Interessam-me os livros e com ele morto não haverá mais.".

Álex 6/21/2010 11:46 da manhã  

estive em españa este fds, não sabia das reacções que por cá tinha gerado a morte de Saramago mas em madrid, com a comunidade portuguesa lá radicada (alguma, claro) percebi que realmente o Sr. provocava "ódios viscerais"; o que não compreendo é o que pode ter a ver um Sr. polémico com a sua obra. Ou seja, comprovo que mta gente não se sente inclinada a ler a obra de um autor com o qual não se identifica politicamente ou porque se sente perturbado com a sua arrogância, declarações polémicas, etc, etc. Mas se é um Prémio Nobel, pelo menos haverá que dar o benefício da dúvida e tentar ler alguém que é considerado como Bom Autor!!!
Eu estava-me a ralar para as polémicas que Saramago causava. Tentei ler várias vezes o Memorial do Convento nos idos 80 e não consegui arrancar, ficava com falta de ar... disseram-me que era normal acontecer, que devia dar-lhe uma 5ª (!) oportunidade e que iria adorar. Penso fazê-lo um dia destes. Com "O ensaio da cegueira" não tive problemas destes e gostei. Não li mais porque não dá para tudo e tenho variado, mas penso ler outros, foram-me recomendados vários dos seus mtos títulos.
Completamente de acordo em que o Valter Hugo Mãe "bebeu" em Saramago

Rui Silva 6/22/2010 3:13 da tarde  

Alex, com franqueza não compreendo de todo as acusações de "arrogância" atribuídas a Saramago. Ou compreendo, não há luz daquilo que diz, mas da forma como em Portugal tendemos a interpretar todos aqueles que se distinguem naquilo que fazem. Mourinho é um exemplo, embora deslocado deste contexto. Refiro antes o Jorge de Sena, que se exilou para não mais voltar, e que deixou escritos de uma violência ímpar relativamente a Portugal. A Maria João Pires, que farta da tacanhez aqui do burgo, e se mudou de piano e bagagens para o Brasil. Ficámos imensamente mais pobres. Estamos a falar de escritores e de uma pianista de nível mundial. Gente que, na sua área, está entre os mais reconhecidos, mais dotados.

Que arrogância existe no discurso de Saramago? Nunca lhe li nada que, contextualizado, pudesse figurar na montra das afirmações arrogantes. Até porque, quando polémico, nunca voltou as costas ao debate, e deu sempre a cara pelas suas afirmações, ou ideias expressas em livro.

Sobre este assunto creio ser feliz o que diz Daniel Oliveira, no Arrastão:

"Não era consensual o seu posicionamento político. Mas era um heterodoxo. Sendo comunista convicto, tanto podia fazer críticas contundentes ao regime cubano como o defender com unhas e dentes. Ia a Israel e não hesitava em dizer o que pensava. Mas não deixava de ir. Discutia a democracia. Era um intelectual empenhado, mas não era um mero instrumento de uma agenda política."

Essa recusa de ser o instrumento de agendas trouxe-lhe dissabores. Mas também milhões de leitores assíduos, empenhados em compreender a sua obra.

Anónimo,  6/22/2010 6:09 da tarde  

Sou uma fã incondicional de Saramago. Li praticamente todos os livros dele e é com muita pena minha que este dia chegou...Ele não era da minha família, não era meu amigo, nem sequer posso dizer que seguia entusiasticamente o seu percurso, contudo, HOJE tenho uma profunda desilusão... um sentimento de SAUDADE imensa,um nó na garganta...

Natacha Marques
Só critica Saramago quem nunca LEU os seus livros, quem nunca teve a oportunidade de se deliciar com as suas metáforas, com as suas imagens...
Também eu, tenho ouvido comentários desagradáveis sobre este grande escritor... que tanto me deliciou ao longo destes anos e tanto fez pela difusão da cultura portuguesa no mundo, difundindo os saberes de gerações através do uso dos provérbios populares.
E o mais aterrador de tudo é que infelizmente, este "contador de histórias" deixou de existir, deixou de poder imaginar cenários, reflectir sobre a pobreza, a morte, a vida, a fé... Fico sinceramente de olhos lavados ao imaginar que nunca mais, poderei usufruir da sua imensa imaginação e coerência...
Felizmente, ainda há tempo para aqueles que o criticam de o LER e de coração aberto descobrir a nudez do ser humano.
Gostava de poder dizer -" Volta...", mas a viagem que fez, já não tem volta.

Anónimo,  6/22/2010 9:54 da tarde  

Levantaram-se do chão e com o dedo em riste apontaram para o Homem e bradaram: é ateu, é comunista, é arrogante, e isto e aquilo ...

Levantaram-se do chão e empunharam seus livros e, com mãos de adeus, atiraram cravos vermelhos ao Escritor que passava, morto ...

Eu não me levantei do chão. Ao contrário, o peso da saudade desse Homem empurrou-me ainda mais para baixo. Perguntar-me-ão e do Escritor? Respondo-vos: li, apenas, alguns de seus poemas e os seus Cadernos, via Net.

Gosto muito mais do Homem do que do Escritor (por desconhecimento da sua obra) que foi José Saramago.

Pois é, saudade é mal sem remédio, tal e qual como o despeito e a inveja.

Nana 6/23/2010 2:53 da tarde  

Para mim é uma perca nacional ! Escritor fantàstico ! Com direito a Prémio Nobel ! Citem-me quantos prémios Nobel foram atribuidos a portuguêses !
Estou longe, e sinto como que um pouquinho de Portugal que se acabou ...

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